UA-123089393-2 A infidelidade virtual e sua repercussão no direito patrimonial
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  • Juliana Marchiote

A infidelidade virtual e sua repercussão no direito patrimonial




O código civil elenca os deveres matrimoniais, entre eles, o da fidelidade recíproca, narra ainda que o adultério é um dos motivos que impossibilita a vida em comunhão.


Segundo uma pesquisa realizada pelo Happn Brasil, 60% dos brasileiros usam aplicativos de relacionamentos, a pesquisa apontou que 20% encontraram o atual ou o último parceiro em redes sociais, sites ou em aplicativos de relacionamento; 71% das pessoas disseram que desejam apenas fazer amizade; 45% querem relacionamentos causais e 40% almejam um relacionamento sério.


Entre dezenas de aplicativos de relacionamentos, há aqueles aplicativos para quem deseja encontros extraconjugais, um desses famosos aplicativos para casados, realizou uma pesquisa, segundo ele, além do fato de estarem se preocupando em ter alguém com quem trair após a pandemia (34% afirmaram isso), 23% alegaram que conversar é "uma grande distração; para 14% significa "ter alguém com quem conversar" ;13% acha que "ajuda a manter um senso de normalidade" e para 10% é uma maneira de "manter a libido".


Essas pessoas que mantêm um contato "erótico-virtual", estão violando o dever conjugal? Cabe indenização?


O tema é bem controverso, gerando muita discussão, parte da doutrina entende que a infidelidade virtual é responsabilidade civil, portanto, é cabível o pedido de indenização. Por outro lado, há aqueles que entendem que a infidelidade virtual, não é traição e mágoas oriundas do rompimento conjugal não justificam uma reparação indenizatória.

Cabendo aqui destacar as palavras de Maria Berenice Dias;


“Quando se está frente à auréola de absoluta privacidade de alguém, e seu agir em nada atinge a dignidade do outro, não se pode falar em adultério ou infidelidade virtual. Senão, em pouco tempo, se estará querendo reconhecer como infringência ao dever de fidelidade o mero devaneio, a simples fantasia que empresta tanto sentido à vida. Não há como nominar de infidelidade – e muito menos de adultério – encontros virtuais, sob pena de se ter como reprovável o simples desejo, ou a idealização de um contato com o protagonista de um filme que se esteja assistindo”.


Com esse entendimento, o Tribunal de Justiça do Paraná, excluiu a condenação por dano moral decorrente de uma “infidelidade virtual”. Trata-se de uma ação de divórcio, onde o homem pediu indenização alegando que foi traído durante o casamento, fato que ele teria descoberto ao ler, no celular da ex-esposa, mensagens trocadas com outro homem.


Para o tribunal a infidelidade de um cônjuge, muito embora cause sofrimento ao outro, nem sempre causará dano moral. No caso, o ex-marido solicitou a indenização sob o argumento que virou alvo de chacotas. Em primeiro grau foi julgado procedente, concluiu-se que a então esposa descumpriu o dever conjugal de fidelidade, por isso foi fixada indenização por danos morais em R$ 30 mil. Segundo o juiz: "O dano inclusive é presumível, pois o desconforto da traição, que não é causa banal, abala qualquer um que a experimente”.


A ex-esposa recorreu e pediu o afastamento da condenação por danos morais. Segundo ela, não ocorreu traição, porque eles não tinham mais relação marital e o próprio ex-marido teria exposto as mensagens a terceiros.


A 12ª Câmara Cível do TJPR excluiu a condenação por dano moral, entendendo que estavam ausentes os requisitos da responsabilidade civil. Além disso, a relatora do caso ressaltou que a ex-cônjuge não expôs e não ridicularizou o ex-marido, observando que o próprio autor do processo enviou para outras pessoas o conteúdo que ele encontrou no celular. Por acessar o aplicativo de mensagens sem o consentimento da ex-esposa, a magistrada concluiu que a prova da infidelidade teria sido obtida por meio ilícito.


Já o TJDF julgou caso semelhante, mas com entendimento diferente, pois condenou um ex-marido a pagar reparação por danos morais no valor de R$ 20.000,00, por infidelidade. Para o juiz, "o adultério foi demonstrado pela troca de fantasias eróticas". A situação ficou ainda mais grave porque, o ex-marido fazia comentários jocosos sobre o desempenho sexual da esposa, afirmando que ela seria uma pessoa “fria” na cama.


"Se a traição, por si só, já causa abalo psicológico ao cônjuge traído, tenho que a honra subjetiva da autora foi muito mais agredida, em saber que seu marido, além de traí-la, não a respeitava, fazendo comentários difamatórios quanto à sua vida íntima, perante sua amante", afirma a sentença.


O magistrado desconsiderou a alegação de quebra de sigilo. Para ele, não houve invasão de privacidade porque os e-mails estavam gravados no computador de uso da família e a ex-esposa tinha acesso à senha do acusado. “Simples arquivos não estão resguardados pelo sigilo conferido às correspondências”, conclui o magistrado.


Quanto ao direito de receber pensão alimentícia, o STJ já decidiu que a traição no casamento e na união estável é descumprimento de dever conjugal que acarreta a aplicação de sanções ao infiel, sendo assim, infiel não tem direito à pensão alimentícia.


Foi o que ocorreu em um processo julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, onde o órgão reconheceu a infidelidade virtual, comprovada nos autos, de uma cônjuge que manteve relacionamento afetivo com outro homem durante o casamento, e por conseguinte declarou a cessação da obrigação alimentar do cônjuge traído.


Para os Desembargadores do TJSP a infidelidade, ainda que virtual, ofende a dignidade do outro cônjuge. Em sede de Recurso Especial a cônjuge que tivera a pensão alimentícia cessada, alegou nas razões de Recurso Especial que as provas para seu suposto comportamento indigno foram forjadas pela parte adversa, de modo que o Tribunal de origem não poderia ter declarado o fim da pensão alimentícia, porém o Recurso Especial teve seu seguimento negado.


Agora, diante de um divórcio ou dissolução da união estável, a partilha de bens não sofrerá a ingerência da traição, ou seja, a divisão do bens ocorrerá sob o regime escolhido pelo casal e aquele que traiu não perderá qualquer direito patrimonial.


Embora a fidelidade seja um dever do casamento/união estável, o dispositivo não faz qualquer menção ao dever de indenizar pelo seu descumprimento. Diante disso, os tribunais vem decidindo que somente cabe pedido por danos morais, quando a traído é exposto a situação vexatória, é humilhado publicamente, ocorre ofensa da dignidade.


Portanto, eventual direito de indenização decorrente da traição conjugal, ainda que de forma virtual, deve ser analisado de acordo com o caso concreto, e concluindo que, se ocorrer grave ofensa a dignidade do cônjuge, haverá a possibilidade de reparação civil.






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