Posso retirar o sobrenome do meu genitor?
- Juliana Marchiote
- há 4 horas
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O nome é a identidade de uma pessoa. Ele carrega história, afetos e, por vezes, dores. Por isso, não é raro que indivíduos busquem alterar seu nome para se sentirem de fato representados por ele — seja incluindo o sobrenome de um genitor socioafetivo, seja removendo o sobrenome de um pai ou mãe biológicos com os quais não possuem qualquer vínculo, e mais do que uma questão formal, retirar o nome do genitor pode significar uma tentativa legítima de reconstrução da identidade, especialmente quando o sobrenome remete a uma história de abandono, violência ou ausência de vínculos afetivos.
Atualmente, a inclusão do sobrenome do genitor(a) socioafetivo (a) é possível diretamente no cartório, com crianças acima de 12 anos, conforme Resolução n. 63/2017 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Essa normativa reconhece a possibilidade de multiparentalidade, autorizando que o nome do pai ou da mãe socioafetivos seja incluído nos registros civis, sem necessidade de exclusão do nome dos pais biológicos.
A retirada do sobrenome de um dos genitores biológicos exige um processo judicial, que será avaliado caso a caso. Os tribunais vêm, cada vez mais, flexibilizando a regra da imutabilidade do nome, prevista na Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/1973). O entendimento é de que o nome não deve aprisionar a pessoa a vínculos que causam sofrimento, angústia ou não correspondem à sua realidade existencial e afetiva.
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso que possibilitou a exclusão do sobrenome do genitor, destacou que:
“O direito da pessoa de portar um nome que não lhe remeta às angústias decorrentes do abandono paterno e, especialmente, corresponda à sua realidade familiar, parece sobrepor-se ao interesse público de imutabilidade do nome, já excepcionado pela própria Lei de Registros Públicos.”
É importante destacar que, embora seja possível suprimir o sobrenome do genitor biológico do nome civil, o vínculo jurídico de filiação permanece preservado na certidão de nascimento. Isso significa que a retirada do sobrenome não rompe a relação de parentesco legal com o pai ou a mãe registrados. Trata-se apenas de uma modificação no aspecto nominativo, retirando-se a obrigatoriedade de utilização do sobrenome do genitor nos documentos pessoais.
Para que haja o rompimento do vínculo jurídico de filiação, ou seja, o cancelamento da relação parental no registro civil , é necessária a propositura de uma ação judicial específica: a ação de destituição de poder familiar, cabível apenas em hipóteses excepcionais e devidamente fundamentadas.
A legislação atual permite que a pessoa maior de 18 anos requeira, de forma imotivada, a alteração de seu prenome, diretamente no cartório, sem necessidade de ação judicial. Essa possibilidade foi introduzida com a Lei nº 14.382/2022, que alterou dispositivos da Lei de Registros Públicos. No entanto, a alteração imotivada do prenome poderá ser feita apenas uma única vez pela via extrajudicial, e eventual desconstituição do ato dependerá de decisão judicial.
A mesma lei passou a permitir, também, a inclusão ou exclusão de sobrenomes por motivos relacionados à alteração do estado de filiação, sendo possível, por exemplo, que cônjuges, companheiros ou descendentes solicitem mudanças no nome quando um de seus vínculos familiares for formalmente modificado. Já a exclusão de sobrenome, quando não houve alteração anterior no vínculo de filiação, ainda exige intervenção judicial.
Em síntese, é possível retirar o sobrenome do genitor ou da genitora por meio de ação judicial, desde que o pedido seja devidamente fundamentado e demonstre que a manutenção do nome representa prejuízo à identidade pessoal do requerente.