UA-123089393-2 Posso partilhar as cotas sociais da empresa no divórcio?
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  • Juliana Marchiote

Posso partilhar as cotas sociais da empresa no divórcio?




No casamento ainda que um dos cônjuges seja sócio de uma empresa, a sociedade empresarial e a sociedade conjugal não se misturam, sendo assim, caso ocorra o divórcio, o cônjuge estranho à empresa não tornará sócio, mas, dependendo do regime de bens adotado pelo casal, e a data que as quotas foram adquiridas, terá direito à liquidação da quota social.


Ademais, estranhos à sociedade somente ingressam na empresa, com a anuência de todos os sócios, em respeito ao princípio societário affectio societatis - trata-se da intenção de constituir uma sociedade, a qual é baseada na vontade expressa e manifestada livremente pelas partes.


Assim como é preciso respeitar a autonomia da sociedade empresarial, é preciso respeitar as regras concernentes ao direito de família, portanto, ainda que seja preciso concernir com o affectio societatis e a função social que a empresa cumpre, tal fato não retira o direito do ex-cônjuge em partilhar os bens adquiridos na constância do casamento.


Diante disso, estando o casal sob o regime da comunhão de bens, total ou parcial, ocorrendo o divórcio, a partilha dos bens será devida à razão de 50% para cada cônjuge, inclusive, as quotas sociais da empresa. No regime parcial de bens, observará o momento que as quotas foram adquiridas, caso tenha sido antes do casamento, o ex-cônjuge não terá direito.


Inclusive, segundo o entendimento do STJ, a valorização patrimonial das quotas sociais adquiridas antes do casamento ou da união estável não deve integrar o patrimônio comum a ser partilhado, pois entendem que o fenômeno econômico dispensa a comunhão de esforços do casal.


A corte entendem também que sem redistribuição dos lucros aos sócios, e sim reinvestimento na empresa, o patrimônio do casal não teve acréscimo, sendo assim as quotas ou ações recebidas em decorrência da capitalização de reservas e lucros também não entram na partilha do casal.


Voltando, o cônjuge (estranho a empresa), conforme dito acima, e nos termos da norma civilista, não pode exigir a quota social, mas terá direito ao recebimento dos dividendos, até a extinção da empresa.


Contudo, partindo do princípio que, via de regra, nenhuma empresa tem prazo para acabar, tal fato pode acarretar muita insegurança jurídica, tanto para a empresa, como para o cônjuge. Imagina as partes ficarem ad eternum, nessa situação?


Além disso, nas palavras de Maria Berenice Dias e Rolf Madaleno, “confirma-se, com alguma frequência na prática forense, a ocorrência de retirada fictícia do cônjuge da sociedade, que, em conluio com terceiro, cede-lhe sua parte com o propósito de frustrar, nesse particular, a partilha que enfrentará no processo de divórcio.”


Isso dito, o que poderia, basicamente, ser feito:

  • Apurar o valor de suas cotas e simplesmente indenizar/compensar por outros bens particulares o ex-cônjuge;

  • Vender as cotas apuradas a um dos demais sócios, claro, se estes quiserem/tiverem condições de adquiri-las;

  • Formar uma “subsociedade”, onde o ex-cônjuge será sócio de seu ex-cônjuge/companheiro em virtude da meação, mas não será em face dos demais sócios que integram a sociedade.

Sob esse panorama, o Código de Processo civil tentou resolver o problema, permitindo ao cônjuge ou companheiro do sócio requerer a apuração de haveres (procedimento contábil, pelo qual avalia-se o patrimônio da empresa) na sociedade, vide regramento:


“Art. 600, parágrafo único- O cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio.”


Desta feita, não ocorrerá efetivamente a dissolução da sociedade, mas apenas à promoção da apuração dos haveres, art. 599, III, do CPC. Mas, é importante salientar que, ainda que a empresa não seja dissolvida, ela sofrerá descapitalização do valor das quotas liquidadas, exceto se os demais sócios suprirem o valor da quota.


Ocorrendo a descapitalização empresarial, diante da perda de uma parte do seu capital social ou ainda, ocorrendo a integralização do capital por outro sócio, poderá ocorrer modificação no poder de voto e decisão de cada sócio, podendo afastar investidores/acionistas. Diante disso, entra em campo um importante ramo do direito, o contratual, infelizmente muito ignorado pelos brasileiros.


Assim, ainda que tenha vários tipos societários e cada qual com seus regramentos, é importante prevê por meio do contrato social, como se dará o procedimento de apuração, diante do divórcio do sócio, prevendo litígios, a fim de preservar os interesses da empresa.


Interessante também, são os pactos parassociais, como o acordo de quotistas, onde os sócios podem convencionar como será o procedimento, caso ocorra o divórcios ou inventários.


Em outro turno, importante mencionar, a apuração de haveres, considera o valor das quotas de sociedade empresarial no momento da separação, cabendo destacar as palavras da Teresa Arruda Alvim Wambier, ao dispor que:


“O marco cronológico para tanto [aferir a apuração de haveres] parece-nos ser o da data em que cessou a convivência entre o sócio e o seu cônjuge ou companheiro, pois este é o evento que a jurisprudência considera como interruptivo da comunhão de esforços.”


Ainda, foi aprovado na III Jornada de Direito Comercial, o Enunciado nº 93, destaca que o cônjuge ou companheiro de titular de EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada) também é legitimado a pedir apuração de haveres para fins de partilha de bens, o enunciado visa evitar a fraude à meação, protegendo o patrimônio do cônjuge /companheiro, diante da partilha de bens.


Por fim, segundo Maria Helena Diniz, a sociedade será considerada simples quando o seu objeto se constituir em atividades próprias do intelecto, tais como: científicas, literárias, artísticas, educacionais, dentre outras, excetuando-se os casos em que o seu exercício constitua elemento de empresa. Diante disso, grande parte da doutrina entende que, em caso de divórcio, não cabe a partilha das quotas sociais.


Portanto, apurando os haveres, reconhecido o direito a porcentagem das quotas sociais, o valor encontrado deverá ser partilhado entre os cônjuges, de acordo com o regime de bens adotado pelo casal, não tendo a sociedade qualquer responsabilidade ou participação no caso, pois a questão é familiar e não societária.


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